quarta-feira, outubro 25, 2006

Caça Palavras

Resposta do Caça Palavras publicado no GLBTteen Zine n. 3 - Outubro/2006

Barbie e o mal-estar na civilização


QUANDO A gente era pequena e as crianças ainda brincavam com bonecos, nós tínhamos a Suzi. Era uma boneca tosca, uma espécie de Barbie piorada. Quando a Barbie chegou ao mercado brasileiro, já não éramos tão crianças assim. Mas pedimos uma para nossas mães, é claro! E fazíamos coisas incríveis com ela, como pintar seu cabelo com canetinha vermelha e raspar sua testa com uma navalha. Depois, inventávamos que ela tinha sofrido um acidente de moto e que tinha ficado desfigurada.
Se fôssemos crianças agora, a gente teria mais opções para o Dia das Crianças. Afinal, nos anos 80 ainda não existiam brinquedos trash. Hoje, por exemplo, você pode pedir para o seu pai encomendar uma linha de bonecos bizarros na internet, os Trash TalkinDolls. São bonecos que falam, mas falam coisas bizarras e engraçadas. E bem grossas.
Umas das que faz mais sucesso é uma versão Exu da Barbie, a Turleen. Turleen está grávida, mas mesmo assim tem um cigarro na boca. E, quando você aperta a barriga dela, os dizeres são o seguinte: "Me dá uma dose dupla. Tenho que beber por dois". Sensacional! Nem nas nossas piores brincadeiras poderíamos pensar uma coisa dessas.
O comparsa de Turleen é Jer Wayne Junior, um aborígene banguela que tem um mullet e bebe cerveja direto da lata. Sua frase: "Depois de quinze cervejas, você continua feia". Maravilhoso. Ken nunca falaria uma grosseria dessas, mesmo que pegasse a Barbie na cama com outro.
Todos esses bonecos grosseiros são destinados a adultos, mas ficamos tentadas a comprar e presentear as crianças conhecidas no próximo dia 12. Será que elas seriam adultos piores se brincassem com essas coisas trash? Teriam algum tipo de transtorno de personalidade? Daí vemos criancinhas de 6 anos com página no Orkut, conversando horas no MSN... E pensamos que uma Turleen não cairia tão mal assim.
Afinal, a vida é dura mesmo. Tá, não é legal ser uma adolescente que fuma. Inclusive é bem errado. Agora, quem disse que a Barbie dá bom exemplo só pode ser louco. Afinal, a menina é uma anoréxica doida. Anoréxica ou bulímica. E o Ken é um mauricinho neoliberal que deve apostar na bolsa de valores!
Bem que poderiam criar um Ken punk ou um Ken artista. E uma Barbie normal. Ou seja, com cabelo meio ruim, espinha e barriga. Só assim o mundo seria um local menos perverso. Só assim...

Momento de histeria
Nós não somos a Barbie e nem procuramos um Ken!

Jô Hallack, Nina Lemos, Raq Afonso
02neuronio@uol.com.br

Texto publicado no caderno folha teen do jornal folha de são paulo do dia 09/10/2006